1

“Nova York: se consegui lá, consigo em qualquer lugar”

Vista do entardecer da cidade de Nova Yorque, em foto panorâmica, onde o sol ilumina ao fundo e as luzes do prédios iluminando os belíssimos e enormes edifícios.

No primeiro momento, a idéia era viajar com mais duas amigas, que também são cadeirantes. Fizemos algumas reuniões de planejamento, pois a minha preocupação não era a viagem em si, mas a logística de três cadeirantes viajando juntas. Este sim era o desafio.

Como a vida nem sempre corre como nós queremos, à medida que promovíamos nossos encontros para planejar da aventura, surgiam situações inesperadas que tinham que ser administrados – e percebemos que alguns sonhos iriam ficar pelo caminho. E entendi que faria a viagem sozinha. Gosto de desafios e estava disposta a aprender com eles. E desistir é uma palavra que não existe no meu dicionário, de modo que Encarei!

Vista aérea da cidade Nova Yorque, ao centro temos o famoso Central Park e ao seu redor milhares de prédios e alguns enormes,Organizar e sonhar – planejar a primeira viagem sozinha para o exterior foi um dos momentos mais marcantes da minha vida como viajante. Era a realização de um desejo, que por alguns momentos, pareceu impossível. Mas quando começou a se tornar realidade, foi tão difícil quanto essencial gerenciar as expectativas com a realidade dos detalhes práticos para se chegar a Nova York.

Tive apenas alguns dias para resolver tudo  e batalhei muito antes de colocar o pé e as rodas no avião… Documentação em ordens e saúde também. É chegada à hora!

O Embarque – logo entendi que precisava de uma boa dose de concentração e coragem para esse momento. Ah, claro, tive uma dose extra de sorte também, pois exatamente no período planrjado recebi um convite para participar Global Partnership on Children with Disabilities, um evento que acontece de 2 em 2 anos na UNICEF, Nova York.

O evento é sobre as ações que mais de 41 países, incluindo o Brasil, desenvolvem na área da criança com deficiência. É estrategicamente pensado para que todos os parceiros participem, no mesmo período, também das reuniões de alto nível da Assembleia Geral sobre Deficiência e Desenvolvimento. Durante esses dias iriam se concentrar ali as maiores autoridades internacionais nesse assunto. Imaginem como estava a “grande maçã” – fervilhando de gente!

Enquanto voava, ainda tensa com o destino desconhecido que me aguardava, pensava em como seria andar sem rumo pela cidade, estar com pessoas do mundo inteiro e o mais instigante, sozinha. Vivi esse estado de alerta durante todo o vôo.

Lá como cá – o céu azul e o sol de outono me deram boas vindas. Cumprido todo protocolo de chegada e bagagens em mãos, tive o primeiro dos muitos “causos” vividos ainda no aeroporto: meu transfer, ou o carro que me esperava, saiu com outra cadeirante (no caso, uma senhora), que, só por também usar cadeira de rodas, o motorista achou que era eu. Como podemos ver, não é só aqui no Brasil que as pessoas acham que cadeirante é tudo igual. Fala sério!

Frank Sinatra tinha razão – agora, acredito que é lá onde tudo acontece. Nova York não dorme e dormir foi o que eu menos fiz durante a minha estada. A cidade é inigualável e esse movimento constante é o que a torna tão especial.

Foram as experiências, as situações, as vivências e as pessoas – sempre as pessoas – que despertaram em mim o instinto da sobrevivência, da aventura, de conhecer novas culturas, formas de estar, pensar ou agir. Viajar sozinha foi tão simples e ao mesmo tempo tão intenso. Foi enriquecedor. Mais que isso, foi transformador.

E não demorou muito para que eu me apaixonasse pela rotina, pela segurança que NY oferece, pela vida cultural, pelo respeito às leis de acessibilidade, pelas pessoas e pela gigantesca diversidade de raça, religião, e estilos.

Não deu tempo de fazer e conhecer tudo, portanto, volto para novas aventuras. E se me perguntar: vai sozinha novamente? Respondo, sem pensar muito: sim! Pois a cada viagem, novas surpresas, outros olhares, acontecimentos, e claro, imprevistos. Mas isto não é ruim, pelo contrário, traz maior dinamismo e empoderamento. E vivi de verdade a famosa frases da letravda música – “Se eu consegui em NY, eu consigo em qualquer lugar”! Ali, aquilo nunca foi tão real e estimulante para eliminar as barreiras do meu dia a dia.

Por isso, se estiver pensando em viajar – mesmo que sozinha, não perca o trem, a carona, o vôo – e boa viagem!

 

mariana_reisA Bailarina Mariana Reis, tornou-se cadeirante aos vinte anos. Tornou-se Administradora de Empresas e Educadora Física. É Pós Graduada em Gestão Estratégica com Pessoas e em Prescrição do Exercício Físico para Saúde pela Universidade Federal do Espírito Santo. É também atriz, colunista do jornal A Tribuna de Vitória, professora universitária, técnica e árbitra de ginástica artística. Atua como consultora em acessibilidade e gestora na construção e efetivação das políticas públicas para a pessoa com deficiência em Vitória. Acredita na sedução diária de superar limites e ir além do que nos impede – não as pernas, os olhos, os ouvidos – mas o cotidiano. Afinal, temos todos medo de enfrentar o mundo e suas barreiras. E todos temos obstáculos. Vamos encarar?



Liberdade de Cair

Bailarino caindo em uma pirueta com braços e pernas em movimento formando um arco em um retrato de grande impacto.A foto está em preto e branco e o jogo de sombras contribui para a beleza do conjunto.

Dia desses, às voltas com uma rampa desnivelada e esburacada levei um belo tombo – cadeira de rodas e tudo. Nada de sério, mas, quem estava por perto partiu apavorado pra cima de mim.Nunca tinha visto tantas mãos diante dos meus olhos.

Confesso, fiquei chateada. Gostaria que tivessem dado uma boa risada e, só depois, fossem ver como eu estava. Teriam feito isso se eu não fosse uma pessoa com deficiência.

Estavam bem intencionados, e nem imaginavam que eu gostaria mesmo daquela coisa normal, que acontece quando se toma um tombo que, se vê logo, não foi grave. Ah como eu gostaria…

Antes que se consumasse o resgate desvairado eu disse firme: Peraí! Deixa que eu me “levante”. E fiz isso cantando Vanzolini: “levanta sacode a poeira e dá volta por cima”. E aí aconteceu a gargalhada de que eu precisava. A gargalhada que me incluiu. Que me fez sentir igual a eles, afinal quem nunca tropeçou?

Depois de ouvir os detalhes da minha queda hilária, da minha patetice (adorei isso!), passamos a conversar sobre os problemas de mobilidade urbana, calçadas esburacadas, rampas e corrimões que inexistem, carros sobre as calçadas, entulho, lixo e tudo mais que nos “derruba” – e não apenas quem está sobre rodas. 610325581b50a215e3326852d131ad01

Num passe de mágica, viramos todos, cidadãos, a falar sobre problemas comuns – mesmo que em escalas diferentes.

Afinal, existem entre todos nós especificidades que nos distinguem, a espera do respeito que nos une. Os problemas de mobilidade são de todos, mesmo que atinjam de forma distinta cada grupo de interesse. Isso é igualdade nas diferenças. Isso é inclusão.

 

 

mariana_reisA Bailarina Mariana Reis, tornou-se cadeirante aos vinte anos. Tornou-se Administradora de Empresas e Educadora Física. É Pós Graduada em Gestão Estratégica com Pessoas e em Prescrição do Exercício Físico para Saúde pela Universidade Federal do Espírito Santo. É também atriz, colunista do jornal A Tribuna de Vitória, professora universitária, técnica e árbitra de ginástica artística. Atua como consultora em acessibilidade e gestora na construção e efetivação das políticas públicas para a pessoa com deficiência em Vitória. Acredita na sedução diária de superar limites e ir além do que nos impede – não as pernas, os olhos, os ouvidos – mas o cotidiano. Afinal, temos todos medo de enfrentar o mundo e suas barreiras. E todos temos obstáculos. Vamos encarar?



Moda adaptada – Existe isso?

ea2e4bfd4fbfd2a261e8e677d3435d36

 

No máximo se consegue via internet ou acabamos por nos se render a roupas sem graça e difíceis de vestir!!

Gente, visual é importante, é nosso cartão de visitas! E vestir-se bem e deve ser permitido a todos com ou sem deficiência.

 

 

Desenho em preto e branco de sapato de baile forrado com renda e cristais delicadamente bordados com salto fino e muito alto com pedras esféricas incrustradasComo é que o mercado de Moda no Brasil , que movimenta mais de 50 bilhões de dólares por ano ainda não acordou para isso?!!

Ora, temos grandes estilistas, especialistas, faculdade de moda, designer, incentivos, matéria prima etc. Só faltam as empresas acreditarem!!!

Não dá mais para ignorar esse segmento – um novo olhar para uma moda, de fato mais abrangente, humanizada, não segregadora e sim, acolhedora, tem sido o foco de estilistas na Europa e Estados Unidos.

Aqui no Brasil vemos isso timidamente – através dos concursos de moda inclusiva e dos incentivos a projetos acadêmicos. Mas é preciso mais.
Vestir bem vai muito além da vaidade – para quem qualquer tipo de limitação, as dificuldades são inúmeras Um exemplo: a falta de etiquetas em Braille que indiquem a cor e o tamanho daquela peça a ser escolhida. É uma coisa simples – que mas que garante uma preciosa independência a quem não enxerga.

Cinderela sobre Rodas – para ilustrar como as pessoas pensam, relato a confissão de meu amigo sobre minha vaidade com o que uso nos pés:
“Engraçado, quando te vi com esses saltos altos enormes na sua cadeira pensei logo, pra que? Se não vai andar. Fiz a pergunta e logo respondi, pra mim mesmo, deixa de ser idiota! Sapatos de saltos altos não são feitos pra andar (são desconfortáveis), foram feitos pra embelezar, pra dar sensação de poder.”
Ufa, ainda bem!

 

mariana_reisA Bailarina Mariana Reis, tornou-se cadeirante aos vinte anos. Tornou-se Administradora de Empresas e Educadora Física. É Pós Graduada em Gestão Estratégica com Pessoas e em Prescrição do Exercício Físico para Saúde pela Universidade Federal do Espírito Santo. É também atriz, colunista do jornal A Tribuna de Vitória, professora universitária, técnica e árbitra de ginástica artística. Atua como consultora em acessibilidade e gestora na construção e efetivação das políticas públicas para a pessoa com deficiência em Vitória. Acredita na sedução diária de superar limites e ir além do que nos impede – não as pernas, os olhos, os ouvidos – mas o cotidiano. Afinal, temos todos medo de enfrentar o mundo e suas barreiras. E todos temos obstáculos. Vamos encarar?