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Para poucos – quando qualidade independe de riqueza

Sala espaçosa aberta para a área da cozinha. As paredes são pintadas de bege claro com efeito de iluminar o ambiente e contrastam com o piso e a bancada da cozinha que são em madeira escura. As cadeiras da mesa da sala de jantar a esquerda da foto e as banquetas da bancada a da cozinha a direita são estofadas em tecidos crú aumentando a sensação de simplicidade e aconchego. Em uma das paredes ao fundo quatro quadros colocados geometricamente em um quadrado dão um toque moderno. Ao fundo do ambiente percebe-se um corrimão branco em sintonia com os armários brancos em madeira da cozinha que revestem o ambiente de serviço . No teto, luzes embutidas clareiam ainda mais o espaço.

Sempre respiro aliviada quando percebo que, em um mundo onde imperam palavras como “globalização” e “massificação” ainda há gente que gosta de pensar e se manifestar de maneira individual e singular.

Quando se pensa  em “para poucos” não necessariamente estamos falando em dinheiro ou na qualidade do que é caro, mas sim, na graça e na delícia de que possa desfrutar de algo mais íntimo.

Ok,  mas antes de mais nada é preciso entender na prática  as palavras  – exclusividade e privacidade – cada vez mais difíceis de ser percebidas como conceito. Como produto de consumo, talvez. Mas não como atitude ou conceitos a manter vivos.

Para facilitar, veja alguns exemplos onde o “para poucos” é sempre melhor vivido do que para muitos:

 Supermercados – já reparou que não há mais supermercado normal? Só hipermercados. São imensos, cansativos e nem sempre mais baratos do que um mercado de bairro.

grupo de pessoas estão numa fila de supermercado aguardando para realizarem o pagamento de suas compras, todos estão segurando uma cesta com diversos produtos

Nas raras vezes  em que vou a um desses, constato que nem sempre as coisas feitas para mais de mil pessoas funcionam tão lindamente para o que foram planejadas e ainda atender bem aos clientes.

Tanto é verdade que agora as grandes redes estão abrindo centenas de lojas menorzinhas com a marca “express”…

Boates e baladas – Ricardo Amaral é que sabia das coisas. Suas casas como Hippopotamus e Papagaio’s, em São Paulo, ou outras que abriu pelo Brasil eram todas na medida certa. Dava para ir da mesa até o banheiro em menos de cinco minutos. Da pista, era possível sinalizar para o DJ que, por sua vez, “sentia” muito mais o queria a galera, pois o espaço era mais mais reduzido. Hoje as baladas são enoooooormes,  com fila no banheiro, glamour zero e falar com o DJ, nem pensar…

Bufês Infantis – cada vez maiores, mais barulhentos e feitos para acomodar de bebês a adolescentes e até coquetéis para adultos. São lugares insuportáveis, de onde tanto crianças quanto adultos saem zonzos. É como se os pais preferissem acostumar os filhos desde cedo as hordas.

Os hotéis – não há mais hotéis, só resorts. Raros são os que realmente prestam um serviço de lazer e entretenimento sem massacrar o hóspede com bufês de comida medíocre, longuíssimas distâncias entre seu “bangalô” e o corpo principal do hotel ou mesmo da praia. Desconfio demais dos resorts. Mas adoro hotéis.

Detalhe da piscina do Hotel Lara, Aquiraz, Ceará, onde temos duas cadeiras de descanso, em madeira, ao fundo um lindo jardim com palmáceas.

Hotel LARA. Prainha Aquiraz Ceara. Brasil 03/2015 © david atlan

Restaurantes – é fato:  pequenos restaurante onde os donos atendem os clientes quase sempre são deliciosos e a comida divina. Por mais que falem tanto das grandes churrascarias brasileiras (e algumas são realmente ótimas) o espaço é totalmente impessoal e é muito difícil de conversar com os amigos, pois são super barulhentas.

Festas em bares – pensando como dona de casa, a única coisa que justifica fazer uma festa em um bar é poder convidar mais gente e não sujar a casa. Mas uma festa em casa, para poucos é muito mais divertida –  confira e me conte!

Pois é: “para poucos” é um estilo de vida para alguns privilegiados. Não necessariamente ricos privilegiados, mas apenas aqueles que entendem que tamanho não é documento e que qualidade, nada tem a ver com quantidade.

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Luxo Brasileiro e o “Humble Luxury”

Ao ouvir a clássica pergunta, respondi logo que queria ser dona de cabeleireiro. Perplexa, minha mãe perguntou por que, e eu, decidida, expliquei:

– “Porque as pessoas entram de um jeito, e quando saem de lá estão mais bonitas e felizes. E no meu cabeleireiro, se a pessoa quiser dormir vai poder, porque as vezes não dá tempo de fazer tudo, tem que ficar quanto tempo quiser”.  Arrematei com uma convicção da qual lembro até hoje.

Em meu primeiro emprego como repórter aos dezessete anos, pirei quando fiz uma matéria sobre o Spa da dra. Ana Aslan – uma das pioneiras do conceito na Europa. Gente!! Era aquilo que eu (criança), tentava explicar com meu “cabeleireiro” em que as pessoas poderiam dormir…

Versão Brasileira – mal sabia que, enquanto fazia a matéria um jovem casal, o estudante de medicina,  Luis Carlos Silveira e a assistente social Neusa, compartilhavam essas ideias ousadas na universidade de Pelotas: queriam criar um centro médico que reunisse os recursos de uma clínica generalista, sem ser um hospital, e hospedagem em ambiente aprazível que não fosse simplesmente um hotel.

No início dos anos 70, já casados, mudaram-se para Gramado, onde, depois de anos de pesquisa e trabalho, em março de 1982, o Kurotel abriu as portas. No Brasil, foi o  Pioneiro em cuidar da saúde, permitindo  uma experiência que vai além,  pois consegue vencer o desafio de equilibrar medicina preventiva, atividades físicas, alimentação gourmet saudável e terapias relaxantes e estéticas.

Naturalmente o Kurotel sempre esteve em meu radar de “sonho para ir um dia”. No entanto, casada com um ítalo brasileiro, acabava frequentando spas fora do Brasil – e alguns aqui, porém mais perto de São  Paulo, onde moro.

Ora, todos, mesmo os mais conhecidos europeus, sempre deixavam algo a desejar:  a dieta era insossa ou o esquema rigoroso demais – deixando você  irritado e paranoico e, mesmo os mais caros e luxuosos eram apenas isso: caros e luxuosos, mas não agregavam bem-estar e/ou mais saúde.

Humble Luxury –  a expressão quer dizer “Luxo Humilde”: luxos aparentemente pequenos ou discretos que proporcionam prazeres únicos. Só fui vivenciar o Humble Luxury aos 63 anos quando cheguei ao Kur, em auto presenteadas férias.

O Kur é a epítome desse conceito: a decoração bonita, com peças misturadas – algumas claramente vintage outras artesanais,  sem a ostentação de marcas, brilhos e falsos dourados.

A equipe interdisciplinar é acolhedora sem invadir, e com um grau de atenção e cortesia que jamais encontrei igual (como trabalho com isso e reparo)…

A natureza  é respeitada, assim como os tempos de cada hóspede/cliente. A comida é espetacular e ninguém “passa fome” – mesmo fazendo exercício e controlando calorias. Ora, o que pode ser melhor do que passar dias em uma festa dos sentidos, equilibrando prazer, bem estar e eficiência para melhorar saúde?

É o luxo humilde: um lugar dessa qualidade e magnitude é coisa nossa, em plena serra gaúcha, brasileiro de pai e mãe!




Luxo e Riqueza além das Palavras!

Ano novo merece sempre uma reflexão e sugiro também “ressignificar” algumas palavras que estão a se perder no mar de modismos e exagero, literalmente “consumidas” de acordo com o mercado ou a vontade do freguês…

Luxo – até pouco tempo associado a riqueza, hoje não é mais assim. O novo luxo pode consistir em liberdade e mobilidade. Independência de horários, morar e viver de maneira sustentável, privacidade absoluta garantida …

Como se vê,  coisas que o dinheiro não necessariamente compra. O luxo hoje é muito mais democrático: seu acesso não é mais limitado a pouquíssimos privilegiados – mas aos muitos que entenderem que o prazer de desfrutar determinados luxos, pode ser  alcançado através de escolhas bem feitas e uma vida disciplinada, com foco nessa construção e busca.

Requinte – o requinte é a cereja do bolo de pequenas e grandes experiências estéticas e existenciais. Novamente, não se deve associar a detalhes complicados e produtos caros – e sim ao aperfeiçoamento de determinada ação, objeto ou obra.

É como melhorar algo que  já está muito bom com inesperadas e bem vindas qualidades. É possível ser requintado, assim como podemos acrescentar requinte a um jardim, a roupa que escolhemos ou o sabor de um prato.

E, novamente, o sucesso disso depende mais do impacto causado por inesperadas sensações de prazer estético ou sensorial do que o montante gasto para alcançar esse efeito.

É o caso de uma refeição ao ar livre sentindo a brisa do mar ou apreciar a a decoração simples e perfumada de um centro de mesa com limões e maçãs verdes e vermelhas…

Rico/riqueza –  o consumo e a riqueza material chegaram a um dos seus ápices em seu ultimo ciclo nas décadas de  90 e 2000 – trazendo uma ostentação opressiva, tanto na moda quanto no comportamento – indo além da vida social, contagiando até mesmo as relações profissionais .

Os excessos em mega festas eram acompanhados por todo tipo de ostentação comportamental – era preciso mostrar muita riqueza e dinheiro: o sucesso e aceitação, mais do que nunca, passou a ser praticamente apenas a conta bancária.

Aos poucos essa onda está recrudescendo – há uma nova consciência de que a riqueza vai além disso e que é essencial ter qualidade de vida, serenidade, bem estar. Senão riqueza nenhuma dá conta.

Elegância – de palavras, de ações, de visual, de estilo de vida… para mim, sempre passa por discrição e privacidade – mas esses são conceitos em extinção hoje, embora ainda essenciais para alcançar um bem estar mais duradouro. Pense nisso. Costanza Pascolato, aqui na foto, é uma das maiores nesse quesito…

Simples – o que antes era considerado “pobre” hoje é o oposto: alcançar e cultivar a simplicidade deveria ser fácil, mas com tanta conexão, comparação e exposição, ficou difícil. É que simplicidade está na coerência de enxergar (e seguir) a linha interna e direta que rodeia nossa mente, alma e coração. Que costura desejos, temperamento, prazer e… respeito, pelo outro e por nós mesmos. Exercício que, na mesma medida que exige, gratifica. Pode conferir!




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Como fazer parte dos que usam A A A

Igreja e Convento de Nossa Senhora da Penha, em Vila Velha, Espirito Santo. Na imagem noturna, aparece toda a construção, na cor branca no topo de um monte sobre as pedras e apenas uma escada de muitos degraus.

Esqueça as listas – os desejos e decisões são ao mais variados: uns juram parar de fumar outros entrar no curso de chinês e há os que mais uma vez se matriculam em academias na esperança de, essa vez sim, conseguir frequentar.

Há os que decidem encarar a mudança de casa e os mais corajosos que optam por apenas uma reforma. Os que dão adeus ao emprego seguro encarando fazer o que realmente gostam. Os desejos e pedidos se sucedem seguidos de milhares de velas acesas na noite da virada do ano e flores para Iemanjá.

Simplifique e use os 3 As – recentemente, uma repórter sabatinou-me sobre o mercado do luxo e os produtos que seriam meus objetos desejo. A matéria era sobre consumo e fiquei em apuros para explicar que meus objetos de desejo e luxo eram diferentes dos normalmente propagados.

Mas tentei colaborar: contei onde comprava roupas, quais cosméticos eram meus preferidos, que tipo de sapatos uso … e por aí foi.

Já no fim da entrevista ela disparou: “E o que significa para você a sigla AAA?”

Respondi sinceramente que para mim essa coisa de AAA e o verdadeiro luxo não dependem de uma marca ou do que você possui – e sim do que se conquista.

Como o direito de não fazer nada, uma refeição ao ar livre em boa companhia, tempo para fazer o que der na telha e ficar desconectado de PCs e celulares.

mesa de café da manhã, numa sacada de um hotel em Capri, Italia, num belíssimo cenário da italiano. Sobre a mesa com toalha com tecido claro, temos copos de sucos, xícaras , pães e ao fundo , flores num vazo .

Minha colega embatucou:

“Mas eu preciso de algo mais concreto, ligado ao luxo…”

O que é um luxo para você? – luxo para mim é ter tempo para tirar uma tarde inteirinha para você no dia da semana que lhe der na telha. E ficar completamente desconectada do mundo. Mas isso não tem grife. E nem preço aliás…

Ou mesmo testar uma receita nova de algo que você sempre quis aprender a fazer e dar certo.

Mas ela continuava esperando uma definição para o tal do segmento AAA enquanto eu repassava mentalmente minhas últimas experiências de “Luxo”:

Lembrei das Grutas e Maquiné em Minas Gerais, a goiabada caseira saboreada ao ar livre diretamente do tacho gigante e fervendo em companhia de minha filha…

Foi então que me vi falando (e nada me tira da cabeça que eu estava apenas repetindo uma frase sussurrada do além):

“Olha, para mim AAA significa Almejar, Alcançar e Agradecer…”

E ela:

 “ Nossa! Perfeito! Genial, vou terminar a matéria com isso!”

Foi quando  pensei que na verdade era uma boa forma de a gente começar e terminar o dia. Ou o ano, para quem se inspirar. Taí: experimente você também!