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O Primeiro Natal de uma Tetraplegica

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Incumbida de escrever esse texto de Natal para o site de minha amiga, fui abatida por uma lembrança de vinte anos atrás, quando retornei ao Brasil tetraplégica, depois de intenso processo de reabilitação nos EUA.

Era uma véspera de Natal.  Além dos movimentos que havia perdido do pescoço para baixo, eu estava visivelmente diferente: com a cabeça raspada, corpo magro…

Mas a mudança principal não era física. Diferente de outras ocasiões, quando retornava de viagem, eu já não tinha meu próprio carro para sair a mil e rever um amigo. Meu apartamento também já havia sido desfeito, assim como minha autonomia de ir e vir para onde bem entendesse.

Naquele Natal também não pude mais voltar a minha cidade (São Paulo). Fui direto para São Bernardo me hospedar com uma amiga da família, já que a casa onde morava e a dos meus pais não tinham acessibilidade. Toda a família teve de ir para essa terceira casa, em uma nova vida.

Pensei que deveria ser a mesma sensação quando se chega a um presídio e todos os seus referenciais ali são diferentes.  E você é obrigado a se adaptar àquele novo universo onde pagará por algo que cometeu.

A diferença é que no caso de uma deficiência ninguém sabe qual dívida está sanando.

O olhar das pessoas e a minha falta de preparo para lidar com tudo aquilo causavam um vazio desconfortante – para dizer o mínimo. Nada era conhecido, embora estivesse retornando ao meu país.

Foi o Natal menos fácil e talvez o dia mais difícil. Mas daquele momento em diante eu sabia que estava preparada para encarar qualquer coisa com menos dor e mais leveza. Tudo seria mais fácil.

E tem sido assim desde então.

 

Mara Gabrilli, deputada federal, com seus longos cabelos loiros, sorrindo, ela usa uma camisa brancaMara Gabrilli, 46 anos, é publicitária, psicóloga, foi secretária da Pessoa com Deficiência da capital paulista e vereadora também por São Paulo. Atualmente é Deputada Federal pelo PSDB.
Aos 26 anos, sofreu um acidente de carro que a deixou tetraplégica. Indignada com a falta de acessibilidade, fundou em 1997 a ONG Projeto Próximo Passo, hoje Instituto Mara Gabrilli, para promover acessibilidade, pesquisas e inclusão social em comunidades carentes e atletas com deficiência. Em Brasília, tornou-se a primeira deputada Federal tetraplégica do Brasil
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